Tempestade

E quando aquelas palavras flutuaram pela inocente brisa, infiltraram-se em mim e sugaram-me lentamente o sangue que corria em mim, o coração. Absorveram-no até deixá-lo tão enfraquecido ao ponto de questionar qual o sentido da minha inútil existência. Haverá vidas mais importantes e preciosas do que outras? Não nascemos em pé de igualdade? Então porque é que outros são felizes a inferiorizarem-nos com o mais simples gesto, o olhar…? Tão doce e fatal. Trazes-me recordações nos castanhos olhos, flores colhidas nos campos triangulares do sol poente. Hoje, não consigo descobrir em ti essas lembranças. Memórias apagadas em tristes sonhos. Traz-me a estação onde tudo floriu. Onde se sentia um aroma suave e refrescante pela manhã. Pela tarde, o tímido céu escondia-se nas suas nuvens cinzentas para não nos ver abraçados. Invejoso! Carícias trocadas ao pé dos pinheiros. Sentia-se assim porque estava só, na vida com todo aquela tempestade que o atormentava. Querias ter um sol como o meu? Eu sei que desejavas isso na tua chuva quente, onde a raiva e inveja fervilhavam. O meu sol… Era só meu e de mais ninguém. Por onde estivesse, eu sei que ela pensaria em mim e eu nela. Sei que existiria sempre o fio de cabelo nela em mim, mesmo na sua ausência. Como eras tão presente. Rainha de si e dos outros nada te demovia. Imponente nos actos, encantavas até os bichos mais retraídos e nervosos que, espantados admiravam como poderia existir tanto amor em duas pessoas. Será um dom? Nada podia quebrar essa ligação, esse elo tão forte. Um dia, as tuas nuvens escureceram mais e desencadearam uma forte tempestade. Ventos destemidos com ideias de vingança abateram-se sobre o pinhal. Vozes de grito ecoavam pelas cabanas abandonadas. A tempestade foi forte demais. Tudo se perdeu. Tudo ficou mais pobre e o encanto morrera, Para sempre? Sim... Como pude eu criar estas nuvens?