Há quanto tempo eu não me sentava aqui
(será que alguma vez me sentei?)
neste banco de madeira gasto, partido e com vista privilegiada para um monte composto de relva seca.
Lá ao fundo, ele volta e parte. Ciclicamente, repete o mesmo ritual quer chova ou faça sol. Há anos que isto acontece; o pobre coitado não se cansa de dar infinitas voltas ao jardim como quem procura algo ou alguém perdido numa qualquer fresta entre as pedras da calçada. De óculos escuros, (já te lembraste, mais alguma vez depois de ela partir, de limpar as lentes?) miras o chão com aquele teu típico descontraído mas eu sei bem que desde a partida dela para um ponto desconhecido do Universo, onde as horas à muito que já morreram, os ponteiros partiram-se num qualquer quarto de hora de tempo já esquecido. Os óculos já não o deixam ver nem o sol ou a lua; os dias correm num pano de fundo completamente escuro à excepção de uma risca que lhe traz uns poucos mas ainda vistosos raios de luz a que ele gosta de chamar saudade. Maldita definição para algo tão complexo. Paradigmas da vida… Sempre te avisei para não te envolveres demasiado com elas, mas tu achaste que o epicurismo não servia para a vida nem para o teu amor de uma vida,
(Sentaste-te e não sei se foi por teres ouvido os meus murmúrios sobre ti ou se te lembraste que o braço dela já não mora no teu, que a união das mãos perdera-se para todo o sempre)
não me ouviste ou negaste em silêncio, lá terás pensado em contrariar-me com a sábia frase de que os mais velhos têm mais experiência. Enganas-te, nem sempre é assim e em conversas de amor todos somos inexperientes. Tal como a morte, aquela que nunca pensaste que um dia chegaria até tu vê-la a partir do teu regaço. Escusas de caminhar cabisbaixo porque ninguém te vai trazê-la, nem mesmo aquele Deus que tu veneravas e acreditavas piamente na sua existência,
(onde está ele quando tu precisas dele?)
não será ele que te trará novamente aqueles olhos cor de avelã, cabelo acastanhado, de mãos finas e suaves que te tocavam o rosto como um rio que embatia docemente contra as margens, nem a boca ou os lábios que tanto admiravas quando ela falava como se tivesses encontrado um qualquer maravilha do mundo… Senta-te aqui comigo, neste
(Teu?)
banco do velho jardim e vamos admirar os anos distantes
(já passados mas não esquecidos)
em que tu e eu amámo-la com a plenitude das nossas forças
.