Conversas a três (I)

Entre whisky e Gin, os dois trocam todo o tipo de olhares tímidos e discretos entre si.
“ - Mais um whisky com duas pedras de gelo.”
Era necessário fazer tempo até ganhar coragem e ir ter ao encontro dela, como num qualquer filme onde o homem confiante, forte, atraente e de cigarro na boca tinha como objectivo “caçar” a primeira mulher que tivesse um rótulo estampado no olhar com as seguintes indicações: carente, financeiramente abastada, necessitada de noites escaldantes com orgasmos gritantes, facilmente descartável, ingénua e minimamente aceitável fisicamente. Este romance é outro género com contornos mais próximos do drama ou da tragédia. O homem não é um herói e a mulher não é ingénua
(se bem que precisa daquelas noites em que a respiração faltava-lhe vezes sem conta)
suficiente para cair numa armadilha tão manhosa com um trago de sensualidade à mistura
(ela sabia que ele jamais seria suficientemente capaz de tal. Porquê?).
Os copos amontoam-se no balcão do bar e, ao de longe, ela vê-o a aproximar-se em passos largos para a decadência total. Sente-se, em parte, culpada pelo momento que ele atravessa mas sabe que não podia iludir-se mais; que um recomeço entre eles seria exigir um empenho descomedido e que nada seria como no inicio pois a sensação de pureza e de lhaneza que morrera no ápice em que o seu segredo fora desvendado no mar de lágrimas salgadas que ela resistira a limpar-lhe. Deixou-o esgotar-se e torturou-o com o seu silêncio.
(arrependida?)
No meio de tanto banzé, tacadas vindas da mesa de snooker, homens e mulheres que se confidenciam e gladiam-se com os argumentos necessários para acabarem numa qualquer esquina a terem sexo, entre risos crónicos e cínicos aqueles dois não param de pensar no passado; no dia em que as duas almas se converteram em só uma.
Olha para ti e vê no que te tornaste: ela voltou-se a descobrir, largou os lençóis com o teu cheiro, fez a cama, sorriu ao mundo, pintara-se com o estojo que lhe ofereceste no terceiro mês de união e escolhera o lápis de cor azul
(Aquele que tanto gostaras que ela usasse)
marinho e retocara os olhos, perdera o medo de encarar o mundo, saiu do triste lar em busca de algo que desconhecia mas que a poderia ajudar a enfrentar a dor. Ele encarara que tinha caído, que falhara redondamente, que não estava preparado para amar aquela mulher. Bebia de manhã, à tarde, quando tinha sede, quando não a tinha… Lamentava-se a todo o instante por não ter amado exaustivamente a mulher que aprendeu a admirar e a respeitar
(e a amar?)
na sua ausência. Perdera os botões de punho que ela dera-lhe enquanto não tinha entendido que o amor tem limites e tornara-se obcecado com os poucos momentos de felicidade em comum.

Largas uma lágrima que foge apressadamente para um qualquer canto do teu corpo onde se possa esconder da tua vergonha, felizmente não vai para os copos de whisky que se vão amontoando no balcão como cabras no pasto. Só de saber que foste meu um dia e te perdi para todo o sempre…
“ - Outro whisky, por favor.”