Quis percorrer o teu rosto com uma pena de gaivota que, por acaso, encontrei no outro dia na praia, cruzar as pontas dos meus dedos na suavidade dos teus olhos castanhos, olhando para o infinito

(ou quem saiba um ponto definido…)

incertezas que te cobriam numa enorme bolha de sabão, num manto de lágrimas que silenciam as vozes que deixam de existir no silêncio dos quartos com vista para a praia onde as ondas morrem nas arribas e nas cabanas dos pescadores

(os peixes gritaram pelo teu nome)

porque só eu e mais ninguém sabe o que vi e senti da janela da pensão, as sombras que as nuvens fizeram no mar e as gaivotas juntas numa rocha seca, os ventos vindos do nordeste das traseiras da pensão, as madeiras que chiavam trazendo os murmúrios esquecidos nos álbuns das fotografias, e eu que quis tocar-te aqui e ali, dedilhar os botões da tua camisa, e mostrar o teu peito inteiro ao vento, ao mar, às gaivotas e arribas, às ondas e aos pescadores, percorrer os vales que erguias e aí poder-me esconder no meio deles, sem que nada me pedissem ou exigissem. Dedilhar os teus peitos voluptuosos como quem dedilha a harpa de um anjo qualquer procurando corações perfeitos muito para lá da linha do horizonte e sentir o corpo que te deram, as curvas que em ti criaram num caminho perfeito até ao fundo da noite.